segunda-feira, 16 de março de 2009

Igualdade

animais, rebanhos
carneiros e lagartas
sempre em fila comem
iguais e bem servidos

todo pasto é igual
perante o gado

facas, maças
espadas e moinhos
horrores em punhos torneados
tremam os olhos indefesos

toda chibata é igual
perante a carne

loucuras, mentiras
falas invertidas
doidos gritam exemplares
os peculiares a se calarem

toda liberdade é igual
perante a ordem

códigos, regras
estatutos e receitas
vomitam bocas sorrdentes
engolem faces contrafeitas

toda lei é igual
perante o homem

terça-feira, 10 de março de 2009

Pacto

na hora do trato
não há pergunta ou resposta
nem hipótese ou aposta
tampouco fiança ou contrato

no instante exato
a testemunha está cega
o juiz tergiversa
o veredito se posterga

os olhos fechados
ou fixos no teto
o pensar distante
inconsciente decide

firmado outrora
de tudo esquecido
ressurge tinindo
o proscrito contábil

as sentenças empoeiradas
são letra renovada
na última cláusula selada
cuja cobrança é agora

Loucura

improvável invasão
do real pelo delírio
o palpável esfacela
no concreto imaginário

de longe se observam
palavras atos sem contato
freios faltam à quimera desvairada
barras sobram na cela do internato.

Fotossíntese

a água está parada
lenta e surda cresce a alga
verdes mares então daltônicos
do dia a noite estão autônomos

a fagulha oculta na floresta
perdida em noite de seresta
cresce louca e devasta
come muito e não faz sesta

se longe vai o inventado
perto está a dura pedra
não sente a chuva nem a fome
espera calma a gravidade

o sol não vê a lua
nem sonha tolo com planetas
solta fogo em rajadas
franco brilho tudo aclara

luz que ilumina letras
refulge em partituras notas
tal qual reluz em botas
que esmagam idéias frescas

alimentadas por doce néctar
alimentarão amarga cepa
são aquelas primeiras algas
outrora ocultas, agora bestas

Prisão

do etéreo ao vazio corre
delira o sonho sempre
ser leve abstrato
recusa
a pedra do contato

puro e simples delinquente
sabia, ter tempo para sempre
palpável a todo custo evita
tão claro e belo o vazio

a singularidade impressa
soerguida estrutura
cresce, amedronta e dificulta
destrói singelos em complexos

o vórtice suga por extremos
desperta dores esquecidas
ao redor, a cela está formada
do pó, ao sofrimento e à carne

Felicidade

como sempre,
se corta a laranja
se arranca a casca
se engole o bagaço

como sempre
a observação
também pergunta
por que
se tudo de repete
nada se mantém
acho que esta coluna pode ser um veículo mais amplo de expressões artísticas. O primeiro passo nesta direção pode ser dado com esta foto. De Jaume Plensa, "A grande nômade."

sexta-feira, 6 de março de 2009

sobre mesa um copo
abriga um líquido
elimina um fato
salienta um risco

sob a cama um saco
guarda rodas tolas
a superstição que teme
também empunha o taco

sob o telhado um teto
protetor protegido reto
fecham paredes portas
vidros e janelas tortas

incônscios seguidos pontos
formados estranha reta
de uma fileira cega
são a verdade incerta

isolados microfatos
em perguntas repressões
são estragos consumados
de certezas protegidas

quarta-feira, 4 de março de 2009

Podem estas frágeis palavras ser um intrumento de resistência da civilização ante a barbárie?

Ódio

nojo
do intermásculo beijo
do feminismo chato
do cantor barato
da frívola fêmea plana
de negros odores densos
da risada cínica atéia
do tostão, na mão hebréia

nojo
destas mãos deformadas toscas
desta voz desta pele
deste monstro, informe e bruto
que habita, um espelho escuro

Caçarola

ao inferno
este caldeirão maldito
cozinhe, natimortas almas
ferva idiotas falas

desprezo seu verde musgo caldo
suas bolhas, de ossaturas fracas
não passa, de insossa água
evaporará, e não sobrará gota

Anticristo



Zandre, "O demônio enamorado"


nas esquinas
numerosas ruas
diversas casas
esquecidas plagas

ali está
enxerga
não visto
fala, estão surdos
à distância
pois correm

é ele
o inimigo, o demo
o belzebu, o lúcifer

indiretos nomes
que dele não fogem
o pé-preto, o rabudo,
o tinhoso, o chifrudo,
o canhoto, o diacho

mas este odiado
em sua roupa surrada
hálito satânico etílico
demoníaco terrível fedor
a pedir esmolas
aos olhos pios
o coisa ruim
é sua única esperança
seu pobre diabo

terça-feira, 3 de março de 2009

Posse



" a dama com chapéu preto e seu cão"


quem de um cão é dono
é também, um canino artefato
nos objetos possuídos
recolhe, sentimentos em garrafas
destila, em olhares frias taças
persegue, etéreas ondas de matéria

corre, não olha
o tempo passa
não vê, a montanha cresce
se perdem controles
olha mais tarde
se espanta, é pouco
que cresça, que viva
que ande, que fale

na hora iminente
o volume tarda
não há espaço
não há saída
ou há saída
mas deixa a outro

a fortuna espera
outro final começa
a aposta lançada
doutro desfecho a promessa

Trincheira

Na cidade universo
dizem vozes panteísta
humanista voa o verbo
batem pinos quadraturas

linhas traçam muitos credos
face que emerge numa língua
e volta a espada ao lingote
o demo, o anjo, franca arte

mas onde soa a cornucópia
o cristo livre e seu rebanho
enfrenta tolo seu invento
o demo, o plano, o cinzento

o repetido monocórido insensato
difunde um evangelho refutado
maquinismo vergastado pelos gritos
sob a égide do livro apagado

acima do mártir artefato
há nuvens pouco-fato
permanece a galáxia escondida
já vista e jamais perdida

Singularidade

o centro destes olhos
é vórtice dobrado
gravidade negativa
repulsão agregativa

dali, fonte emanam
tristes súplicas pungentes
doidas alegrias aparentes

também
sugam sangue fresco
se inundam
do terrível e grotesco

impossível controlados
seguem vivos à vontade
evitam partes e metades
tolos buscam a verdade

Norma

a chuva cai
observa a regra
e vai

assim,
como a pedra,
a árvore,
o sol e a lua

mais longe
no vazio imaginado
não brilha a luz
nem som ecoa
a régua falha
e a arte brota